Em tempos de fake news, quem tem boca trate de abrir bem os olhos.

Até os números andam tendo problemas com as "fakes" na cidade da Matemática. Dizem por lá que a fofoca é a filha dileta da inveja.

Animado com a invenção do imperador, o 3 correu para fora do palácio saltitando de alegria, esquecido do motivo pelo qual havia ido até lá. Nem lembrava mais se tinha uma pergunta ou se recebera para ela alguma resposta.

Horas depois o 2 e o 3 já andavam de lá para cá, de cá para lá, com suas cabeças baixas, os olhos fixos no tal aparelhinho brilhante e barulhento, tic-tic-tic, sem piscar um só minuto, tic-tic-tic.

Gastavam horas preciosas tirando fotos de si mesmos e de todas as coisas que faziam durante o dia no apetrecho mágico, envaidecidos da própria imagem. Queriam provar que eram os números preferidos do imperador e, portanto, os mais belos e felizes em suas vidas solitárias e perfeitas. Contudo, apenas conversavam um com o outro à distância, sem nunca se encontrarem de fato. Se caminhavam na praça e seus caminhos se cruzavam, não se viam ou se cumprimentavam; se almoçavam na mesma mesa, nunca trocavam uma só palavra ou um singelo olhar, animados demais em fazer a linda necessidade brilhar e emitir sons, tic-tic-tic.

De tanto que se gabavam do “presente” imperial, alguns números ficaram negativos de inveja e, maldosos, começaram a espalhar, aos cochichos, que por passarem tantas horas com suas cabeças curvadas sobre o mágico aparelho, certamente o 2 e o 3 nunca mais conseguiriam ficar eretos outra vez.

Trecho do livro "O valor de cada um".